SoproNascera normal, de parto normal, crescera assim. Feliz, falante, tudo como deveria ser. Cabelos muito lisos, comportados, tudo muito direito. Bem branquinha, muito regrada.
Até que, quando menina, conheceu o amor. Começou com um olhar. Só dela, aliás. E foi crescendo, devagar, como uma sombra invadindo a sala de estar. É, ela conheceu o amor e as sombras, os dois como um só. A história se desenrolou, como qualquer história e, enfim, o tempo os separou.
O tempo, ah... Ele nunca para de passar. Ele passou tanto, tanto e sem perdoar. Bem aí, ela percebeu que o amor não tinha passado.
Chorou, sofreu, tudo de novo. E, no meio do seu completo desespero, pediu a Deus, com as forças que lhe restavam, que o tirasse do amor que ela tinha no coração. Que ele (o amor), tão delicado, fosse guardado em uma caixinha, trancado à chave. E ficou leve, bem leve, como antes das sombras.
Sem mais nem menos, em um dia qualquer, começou com um olhar. Uma caixinha; uma chave. Abriu. Era tão bonita a caixinha... Foi como uma flechada no peito. Tudo ficou muito claro. Transformou-se em vento e, depois de fazer redemoinho e destruir a casa e as lembranças, foi como ventania até a pedra mais alta da praia. Sentou-se como uma deusa, bronzeada e com os cabelos bagunçados; ondulados e sempre em movimento. Ela segurava a caixa.
Agora é brisa do mar, fazendo marola. De vez em quando, aparece alguém solitário e sem amor na sua praia. A caixa também aparece, junto com uma brisa forte. Ela tenta tocar o coração de alguém, para que possa descansar em paz. Com ele guardado na caixa e o amor puro no coração. Para que consiga, finalmente, se jogar da pedra e virar concha do mar.